terça-feira, 25 de janeiro de 2011

"Três mil amigos com muitas aspas"



Com a descoberta do iTunes veio o despontar de uma velha paixão, a rádio. A possibilidade de ouvir programas de rádio gravados no dia anterior e que, para grande surpresa minha, tinham muita coisa interessante. Descobri, há pouco tempo, um novo programa que anda por este éter fora há muito tempo: Prova Oral.
Uma edição de Fernando Alvim, e que conta com a participação da sua "wing-woman" Cristiana Alves.
Custa-me perceber como é que isto já anda no ar há 10 anos e nunca o tinha ouvido até há cerca de duas semanas. Desde aí, fiz os downloads dos podcasts, e segui com religiosa atenção, graças ao tempo livre de que usufruo, a todas as entrevistas e a todos os temas debatidos.
No último que ouvi, o convidado habitual era Francisco Salgueiro, um estudioso do mundo juvenil (eu chamar-lhe-ia sociólogo) que publicitou a sua obra (de referência, diga-se) e afirmou coisas que me fizeram pensar muito sobre a geração que me rodeia, os meus contemporâneos.

Entre outras, as palavras "Rede Social" e "Facebook" foram as que mais vieram à baila, sendo raras as vezes em que "perigo" lhes era disassociada.
Não pude deixar de concordar dessa frequente junção de palavras, e posso-vos dizer que num pequeno excerto de palavras, Francisco Salgueiro conseguiu explicar a mim mesmo a razão de estar afastado desses fenómenos à cerca de 4 anos: a exposição é imensa, a pressão de grupo em ter amigos, comentários e afins influencia a auto-estima a quem se deixa ou diz não se deixar abalar por isso mesmo.
Chegámos a esta decadência, com a evolução: qualquer um pode seguir-nos o rasto de um sítio onde tenhamos estado. Pôr no perfil a preferência de estar em qualquer lugar, publicar fotos em casa, ou perto dela em que se consiga perceber sítios das redondeza... tudo isso pode levar qualquer mal intencionado a perseguir os nossos passos, e tê-lo à porta de nossa casa, à nossa espera, quando menos esperamos. E não, como Francisco Salgueiro (e acreditem que o homem sabe do que fala) diz, isto não acontece só nos filmes; a pressão do grupo, como referiu o convidado da Prova Oral de 12 de Janeiro passado, passou, em muito pouco tempo (e eu confirmo-o) "de uma turma de escola para três mil amigos com muitas aspas"... enfim, chegou-se a um tempo em que é difícil ter vida social sem o Facebook ou outra rede social, e, do outro lado da faca, privacidade com o mesmo.

Ouço regularmente a desculpa "Só tenho Facebook porque posso encontrar pessoas que não via há muito tempo". Mas isso chega para se abdicar da privacidade e estar-se sujeito a regras de socialização em que os nossos amigos e inimigos, gostos e personalidade terão de estar de acordo com o que é "cibernauticosocialmente" aceitável?! E as fotos que se publicam em poses ousadas?! É para chamar a atenção desses amigos?!
Enfim, eu não consigo manter os termos "Rede Social" e "Invasão de Privacidade" afastados. É, para mim uma das grandes ameaça dos novos tempos: pelas doses perigosas de auto-estima com que se joga (e as proporções que pode tomar com coisas completamente fúteis) e pela consequente (ou não) exposição de um mundo onde ainda se tem a privacidade como um direito fundamental.

"Alerto", claro, sobretudo os meus contemporâneos que muito navegam essa nova aldeia global do mundo social. Não é por falta de aviso que fico de consciência pesada. E quem leu este texto, e pertence à geração de 90, não poderá ficar sem ele na memória... não terão o direito a ser estúpidos, como todos os adolescentes, segundo um dos convidados da Prova Oral (palavras que subscrevo), têm. Ou estarei eu a sê-lo?


Mais uma coisa que me chamou a atenção, na edição do passado dia 12 da Prova Oral, um problema aparentemente crónico em gerações de pessoas que têm direito a ser estúpidas. Um exemplo dado pelo próprio Francisco Salgueiro: um grupo de adolescentes bebe mais por pressão, pelo facto de um dos membros já ter bebido uma garrafa de vodka; dão riscos de cocaína por haver alguém que se gaba desse feito; começam a praticar sexo descomprometido e sem valor sentimental porque alguém já disse que fez. Na conclusão: "Faz-se tudo em conjunto... mas não se criam relações interpessoais".... não podia dizer melhor!
E depois disto, claro, a depressão de já ter feito tudo precocemente e não faltar experimentar nada. A sede do "aqui e agora" acaba por levar a adolescentes perdidos a amargura do ciclo vicioso, e à entrada com os dois pés no grande mercado que é o mundo das drogas.

Lamentavelmente ou não, este é o futuro.

1 comentários:

JoanaFigueiredo disse...

Nao me tinhas contado deste programa de rádio...só sabia daquele que dizem piadas e assim daquele homem com uma voz bastante agradável (xD), que ouvimos algumas vezes juntos :)

Relativamente ao conteúdo do programa, concordo plenamente com o que foi referido. Estes novos meios só servem para, ou aumentar a auto-estima ou, pelo contrário, elevá-la ainda mais. A privacidade de cada um de nós fica ao descoberto mas não concordo num ponto: a perigosidade de um individuo adquirir informações, como por exemplo morada e assim. Cada um de nós que tem essas redes sociais só devia meter fotos e outros tipos de informações que não fossem muito pessoais. Julgo que, de certo modo, as pessoas é que criam os problemas.

Amo-te :)